As Mulheres de Atenas

MUDIAL DE VETERANOS | Lisboa 2021

Nos dias iniciais da prova, no Pavilhão nº1 do Estádio Municipal, tudo corria bem. O ambiente era caloroso e os combates sucediam-se nas áreas de competição. Mas faltava qualquer coisa. O regressado público nas bancadas incentivava, aplaudia e as vozes do Azerbaijão, da Geórgia, de Angola, do Brasil, de França e de outros países faziam-se ouvir com vigor. Mas na verdade, algo estava a falhar.

Os árbitros abriam os braços e sinalizavam aos atletas autorização para acederem ao tapete e dirigirem-se ao centro. Dois homens, competidores experientes avançavam e concluíam os rituais de auto-motivação. O combate começou e terminou rapidamente. A vitória foi atribuída, o vencedor saudou e abraçou demoradamente o seu adversário. Já se conheciam. Em Marraquexe o desfecho tinha sido diferente. O calor da amizade estava a funcionar. Mas, na verdade, sentia-se uma ausência. Algo a que já não estávamos habituados.

No final das jornadas os pódios enchiam-se de homens vitoriosos. As medalhas erguidas ao céu confirmavam o estatuto de guerreiros vencedores. Pairava no ar uma mistura de odores e ruídos próprios dos cavalos de corrida que entram na fase de repouso. Longe do Coliseu e dos anfiteatros de Pompeia mas perto da alma de gladiadores.

O quarto dia

Já passa um pouco das onze da manhã. O speaker Tiago Almeida anuncia combates no tapete 1. Ouvem-se nomes até aquele dia totalmente ausentes: Carolina, Bianca, Hanane, Rikke, Ornella, Lisa, Catarina. Lena, Anita, Katia, Souhir, Rosangela, Lara, Carla, Aicha.

O judo estava a regressar à sua normalidade. Homens e mulheres estavam a combater em pé de igualdade nos palcos das competições internacionais.

Regresso ao passado

Os três dias anteriores, com a participação exclusiva dos atletas homens, tinha sido um imperativo que o número de inscrições determinou. Mas na verdade fez-nos regressar ao passado e, de alguma forma, serviu para nos relembrar o fraco cenário de um judo “reservado aos homens nas grandes competições internacionais”.

A diversidade, as emoções partilhadas, os abraços e os sorrisos de todos aqueles que compõem a comunidade inclusiva do judo vieram à luz do dia.

Agora no pódio emergem outros olhares. Os guerreiros permanecem guerreiros mas as Mulheres de Atenas, como cantou Chico Bouarque, referenciam de forma discreta, suave como o judo exige, ali mesmo ao lado, outra forma e sentido para a vida, temperando o espírito guerreiro secular e valorizando a energia coletivamente construída.

Fotos © JM

Editado 13h28 /speaker

SOBRE O AUTOR | Editor

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *