Almada foi Sud-Express para Paris

Bárbara Timo, Patrícia Sampaio e Rochele Nunes

E o Grand Prix fechou com chave de ouro. Houve festa, judo, encontros e muita emoção à mistura. E claro, houve medalhas para atletas lusos ao mais alto nível. Portugal termina na segunda posição da classificação geral numa prova do IJF World Tour, é obra!

Bárbara Timo, Patrícia Sampaio e Rochele Nunes, com as duas medalhas de ouro e uma de prata, fizerem vibrar um público entusiasta no Pavilhão do Complexo dos Desportos de Almada e, com estes resultados, deram um grande impulso às suas candidaturas a uma presença nos Jogos Olímpicos de Paris em 2024.

Patrícia Sampaio, um regresso em cheio

Para quem acompanha o percurso da atleta de Tomar e que sentiu nas suas conquistas iniciais um enorme potencial de afirmação ao mais alto nível do judo mundial, não deixou de temer que as suas sucessivas lesões, que corresponderam a intervenções cirúrgicas, poderiam por em causa a antevisão inicial. Acontece no desporto. E nos desportos de combate, ainda de forma mais frequente. Uma primeira lesão grave pode fazer reverter um sentido de progressão muito promissor.

Mas Patrícia ontem colocou o seu carimbo no dossier “Estou de regresso a 100%! Paris é meta inquestionável!” pareceu ontem afirmar quando levantou os braços da vitória virada para um público que a apoiou sem descanso.

Nas vitórias da judoca do Gualdim Pais confirma-se a combatividade de sempre, o seu sentido ofensivo, a procura permanente de uma solução ou de um erro das adversárias. Mas verifica-se ainda uma readaptação do judo de Patrícia Sampaio às evoluções da modalidade ao mais alto nível competitivo. Uma secundarização das soluções atacantes em makikomi e em ataques laterais o-soto-gari e variantes em favor dos ataques baixos, por vezes de joelhos, baseados no seoi-nage e em sode.tsuri-komi-goshi que comportam menores riscos de contra-ataque e que introduzem maior flexibilidade no kumi-kata.

Podemos imaginar a reformulação da preparação física para estas novas abordagens e todo o trabalho de reorganização do processo tático em combate que foram introduzidos. Uma coisa certa, no plano da eficácia os resultados são excelentes. Aqui também mérito do treinador Igor Sampaio que, para além de ser irmão de Patrícia, revela uma enorme cumplicidade nas atitudes fora da área de competição, distinguindo-se pela forma discreta como realiza a sua ação persistente e esclarecida na modalidade.

Patricia Sampaio na final de -78kg

Rochele as vantagens e as dificuldades do meio termo

A atleta do Benfica beneficia em muitas situações de não ser uma “pesada plena”, apresenta face às suas adversárias desta “categoria” uma mobilidade e uma capacidade de esquiva superior mas revela uma grande dificuldade em atingir com eficácia os seus objetivos de ataque, porque nestas circunstâncias provocar um real desequilíbrio associado a velocidade é tarefa de titã.

Esta aparente injunção paradoxal terá que ser trabalhada de forma coerente e persistente para que a prata se transforme em ouro. Ou seja para que no meio termo seja encontrada a virtude.

Nas vitórias de Rochele, até chegar à final, e no próprio combate da final cujo desfecho poderia ter revertido a seu favor atendendo ao wazari que pontuou sobre a atleta vencedora Kim, da República da Coreia, observámos uma atleta bem preparada e com grande motivação. Paris 2024 ainda vai ter muitas etapas mas o arranque foi promissor.

Rochele Nunes contra KIM (KOR) na final de +78 kg

As 3 mulheres

Numa modalidade desportiva dominada por homens em todas as suas estruturas dirigentes e na qual as atletas femininas são consideradas “excelentes assistentes” de treinadores e muito eficazes em “funções de retaguarda, organização, administração” as medalhas que vão surgindo, prova após prova internacional, emergem do judo feminino quase sem exceção. Se colocarmos de lado o fenómeno desportivo e humano que é Jorge Fonseca, podemos concluir que existe uma décalage óbvia entre os contributos dados e as responsabilidades assumidas pelas mulheres no judo.

Olhando para a Mesa de apresentação do Grand Prix de Portugal no dia do sorteio e para a tribuna oficial dos representantes institucionais, verificamos que a “cultura do galo guerreiro” está presente em toda a linha. Mas como o judo está cada vez mais associado ao mundo dos negócios, esta presença compreende-se, esse terreno também está reservado ao universo cultural dos homens.

As 3 mulheres da série televisiva que a RTP passou em 2018 eram Natália Correia, Snu Abecassis e Vera Lagoa. Uma poeta, uma editora e uma jornalista. Em Almada as 3 mulheres foram outras. Mas as seis produzem efeitos hoje ainda pouco detetáveis: abrem caminhos. Abrem portas de mudança porque o que fazem, fazem bem e tornam-se consensuais pelo saber e pela magia que produzem.

3 mulheres, na ficção televisiva e no Judo em Almada

Fotos @ IJF K.Tamara e S. Gabriela

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