Fernandes mete o judo em política e complica a pacificação da modalidade

No reino dos paradoxos, um presidente destituído exige a demissão de um governante

Jorge Fernandes veio à praça pública exigir a demissão do Secretário de Estado da Juventude e Desporto.

Atacou ferozmente o IPDJ e pediu também a demissão do respetivo presidente, Vitor Pataco. Não se sabe bem em nome de quê e de quem, mas o discurso do ex-dirigente da FPJ leva a pensar que se trata de um ajuste de contas da federação com as estruturas da tutela, quando na verdade Fernandes só se representa a si próprio e não pode ser porta-voz de uma modalidade da direção da qual foi afastado por irregularidades praticadas durante o seu mandato.

“Podemos confiar no IPDJ, que ameaça com a retirada da utilidade pública? Que retira as verbas, que obriga a fazer as eleições através de uma norma ilegal deles, que [o ato eleitoral] era para todos os órgãos sociais e os delegados? Podemos confiar num secretário de Estado que ameaça com a utilidade pública? Que fez o que fez, ele e o IPDJ. Podemos nós confiar nas instituições do Estado? Vou mais longe, acho que o Vítor Pataco e o secretário de Estado se deviam demitir imediatamente, eles próprios”, afirmou à Lusa o ex- presidente Fernandes que foi destituído.

Mentiras e falsidades

João Paulo Correia, Secretário de Estado da Juventude e Desporto

Mentiras e falsidades terão sido usadas pelo treinador de judo de Coimbra nos seus ataques ao governante João Paulo Correia. Atuações autoritárias, impositivas e até anti-democráticas de ingerência por parte do IPDJ foram invocadas no já citado ajuste de contas de Fernandes.

“Desminto cabalmente as acusações. São falsidades de Jorge Fernandes relativamente às conversas que teve comigo. O Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ) atuou sempre com a autonomia que lhe é conferida na lei como entidade fiscalizadora da FPJ”, clarificou João Paulo Correia

O pedido de demissão do Secretário de Estado assume um caráter político inusitado e coloca o judo em maus lençóis. Os desmentidos de João Paulo Correia colocam Fernandes numa posição similar aquela que ocorreu com os atletas de Alto Rendimento e do projeto olímpico como Telma Monteiro, Bárbara Timo, Patrícia Sampaio, Rochele Nunes, Anri Egutidze, Rodrigo Lopes que depois de divulgarem uma Carta Aberta de alerta, principalmente sobre as condições da sua preparação para o ciclo olímpico, foram alvo de autênticos insultos e até de ameaças de processos em tribunal, na praça pública.

No mínimo, um pouco de ética republicana

Destituído pela Assembleia Geral da modalidade, a cuja Federação presidiu nos últimos anos, Jorge Fernandes procura minimizar as consequências e o próprio conteúdo das suas incompabilidades.

“Na opinião dele (Juiz), o presidente que é destituído não deveria poder candidatar-se nesse mandato. Por falta de idoneidade. Ora, aqui, não é o caso. Eu não fui destituído por falta de idoneidade, fui destituído por duas incompatibilidades. São coisas diferentes”, argumentou numa entrevista recente à Sportinforma/Lusa.

Tudo indica que Fernandes não terá percebido que esteve a desempenhar funções numa organização que é de utilidade pública. Não se trata de uma atividade empresarial ou de outro tipo nas quais a “gravidade” das incompatibilidades não é medida, entre outras, pela dimensão ética. Ou seja ser servidor de grupos de cidadãos em assuntos de interesse público obriga a uma “posição de ética republicana”. Não é compatível com estes critérios servir-se a si próprio quando se espera que sirva os outros.

Pelos vistos Fernandes não percebe que, numa instituição como uma federação desportiva de utilidade pública, no mínimo, só se poderia contratar um filho para os quadros da organização através de UM CONCURSO que desse transparência à valorização das competências eventualmente verificáveis no candidato. Sem concurso independente estamos perante o favorecimento, o privilégio e o nepotismo.

O judo e a confiança

Não estará em causa, num plano mais geral, que uma federação desportiva tenha uma atitude crítica face à tutela. É do seu direito e as relações de sujeição em nome do financiamento público seriam também inaceitáveis. Mas neste caso estamos perante um pedido de demissão de um governante. Trata-se de um ato político de grande gravidade, que contribui direta ou indiretamente para campanhas partidárias em curso. No fundo foi tomar partido em nome do judo. Um abuso de poder, de quem já não tem poder.

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