EDITORIAL – Os Jogos

Entregar o ouro ao bandido
Carlos Ribeiro – Editor

Muitas vezes apresentados como a última ligação entre os povos do planeta, como a derradeira ação unificadora entre países e continentes, os Jogos Olímpicos modernos apresentam na atualidade várias facetas que são controversas e até paradoxais. O que emerge para o grande público é o sentido da grande festa e do acontecimento global com o qual todos se deveriam identificar sem quaisquer restrições. Mas esta dimensão coletiva e até fraternal dos Jogos não passa da ponta do icebergue de algo mais complexo e diverso que importa sinalizar.
Os Jogos são uma grande plataforma de negócios cujo mercado está assegurado por ciclos de 4 em 4 anos. Não é nada mau tendo em conta a instabilidade e a insegurança que prevalece nas transações económicas e financeiras na era da globalização. Acresce a esta particularidade de um mercado garantido o facto nada desprezível da sua concretização ser sustentada pelos Orçamentos Gerais do Estado dos países participantes, ou seja, os impostos dos contribuintes criam bases estruturais para negócios cartelizados. Entre outras áreas sinalize-se a área dos Media com os direitos exclusivos de imagem para grandes multinacionais e a proibição de órgãos de comunicação independentes captarem imagens e difundirem o seu olhar específico através da sua produção autónoma.
Outra dimensão, da parte oculta do icebergue, radica na política equilibrista na gestão dos conflitos que afetam globalmente o planete quer ambientais quer político-militares. Apesar dos esforços que a Câmara de Paris e os Organizadores dos Jogos realizaram para vender o Paris 2024 como uns Jogos Verdes, a realidade está à vista: com 15 milhões de pessoas a deslocarem-se para a capital francesa, o impacto dos Jogos no agravamento das condições ambientais globais vai ser extremamente negativo, ou seja, mais importante que o ambiente são os negócios.
Noutra dimensão, a político-militar, a gestão desigual das participações de países como a Rússia, a Bielorrússia, Israel e outros com conflitos, diretos ou indiretos, armados, não consegue ser camuflada pela presença de equipas de refugiados cuja condição foi provocada por alguns dos países que são candidatos a medalhas e poderão viver os momentos de glória que os Jogos oferecem, neste caso “entregando o ouro ao bandido!”.