25/04/2025

Biografia, recordar Kiyoshi Kobayashi

livro1

O judo depois de Abril [2]

Por Frederico Salgado, in Judo Ilustrado KYU&DAN – Mestre Kiyoshi Kobayashi

(Reedição e reimpressão da 1ª edição, aumentada. Centro Cultural Kobayashi | 2016]

A partir de 1974 dá-se um novo incremento na modalidade.  Assim, na sequência do 25 de Abril e da democratização do país, sob o impulso da então Direção Geral dos Desportos é apoiada a formação de monitores de Judo e a abertura dum número considerável de novas salas ou melhoria das existentes, através da cedência de tapetes novos.  

Com base no Decreto-Lei nº 460/77 de 7 de Novembro a Federação Portuguesa de Judo é considerada Instituição de Utilidade Pública. Em 1977 a Federação organiza o primeiro curso de treinadores de 4º grau. Da dinâmica da modalidade, surge a necessidade da mesma se organizar duma outra forma, com base em estruturas associativas que representem os seus clubes na Federação, em vez da representação direta até então.  

Eanes no Pavilhão dos Desportos

As primeiras Associações de Judo devidamente legalizadas foram a Associação de Coimbra, criada em 12 de Abril de 1978, com estatutos publicados no D.R. de 10 de Julho de 1978 e a Associação de Santarém, com estatutos publicados em 9 de Maio de 1978. Em 1980, a Associação Distrital de Judo de Lisboa organiza com grande sucesso o I Campeonato Aberto de Lisboa – Internacional, tendo o Presidente da República, General Ramalho Eanes e a família, assistido ao mesmo, no Pavilhão dos Desportos.

Medalhas e títulos

Teresa Gaspar participa nos Jogos Olímpicos de Seoul, em 1988, onde o Judo feminino foi demonstrado pela primeira vez. Em 1989 realiza-se o primeiro Congresso de Judo. Em 1991, Filipa Cavalleri obtém a primeira medalha em Campeonatos da Europa de Juniores, ao classificar-se em 2º lugar. Em Campeonatos da Europa de Seniores, Justina Pinheiro conquista a primeira medalha feminina, bronze, em 1994. No mesmo ano, Michel Almeida obtém a primeira medalha em campeonatos do mundo de juniores, a Medalha de Prata. Em 1995 Filipa Cavalleri conquista a primeira medalha em Campeonatos do Mundo de Seniores, o bronze e em 1996 Pedro Soares conquista a primeira medalha da Europa de Seniores, masculinos, a prata. A primeira Medalha de Ouro em Campeonatos da Europa de Seniores é conquista por Nuno Delgado, em 1999, que viria a conquistar a primeira medalha olímpica, bronze, em Sydney, em 2000.

Na rota dos torneios internacionais

A partir do início do século XXI o Judo assume-se como uma das mais relevantes modalidades do nosso país, sendo a Federação muitas vezes apontada como um “case study” de sucesso. Em 2004, em Atenas, Carlos Duarte torna-se o primeiro árbitro português a arbitrar em Jogos Olímpicos. No feminino, a primeira Medalha de Ouro em Campeonatos da Europa é ganha por Telma Monteiro na Finlândia, em 2006. Portugal entra na rota dos grandes torneios de judo internacionais em todos os escalões de idade e realiza, em 2008, o Campeonato da Europa de Seniores, em Lisboa, obtendo diversas medalhas, com destaque para a Medalha de Ouro de José Neto. A União Europeia de Judo distingue a Federação Portuguesa de Judo pelo melhor campeonato da Europa realizado até então. Finalmente e no momento em que este artigo é escrito, Telma Monteiro conquista nos Jogos Olímpicos do Rio do Janeiro a Medalha de Bronze, a primeira medalha olímpica para o judo nacional feminino. Com esta conquista torna-se a maior judoca de sempre portuguesa e uma das melhores atletas do panorama nacional e internacional.

KK presente!

Em todo este percurso, com intervenções em diversos domínios, Kiyoshi Kobayashi esteve sempre presente. Foi selecionador e treinador da seleção nacional e liderou diversas seleções de Judo a Campeonatos da Europa e do Mundo e dos Jogos Olímpicos de Montreal, Los Angeles e Seoul. Durante a sua permanência em Portugal, foram muitos os Mestres japoneses que nos visitaram. Estiveram entre nós Jojima e Ogura, Kyoshi Mizuno (1959), Natsui, vencedor do 1º Campeonato do Mundo, acompanhado por Saberro Matsushita (1961), Ito Sunichi (1963), Tanaka e Toriumi (1968), Masatoshi Ohi, nos Açores (1968), onde permaneceu 10 anos e lançou as bases do desenvolvimento do judo, e onde se mantêm 20 anos depois, Yamamoto (1968), no Porto, onde permaneceu um ano, Toriumi, Inone, Nakamura e Yamamoto (1969), Tomita (1970), Daigo, duas vezes campeão do Japão (1973), Dr. Risei Kano e Prof. Matsumoto (1973), Isao Inokuma, campeão Olímpico, do Mundo e duas vezes campeão do Japão (1979), Murakami (1981), Hidetoshi Nakanishi, campeão do mundo, (1984), batido por ipon pelo Hugo de Assumpção no encontro Portugal-Japão, Katsuhiko Kashiwazaki (1999), Sumio Endo, Hiroshi Minatoya, e Ichiro Abe, entre outros. Apesar de radicado em Portugal, K.K. nunca perdeu o contacto com o Japão, mantendo-se ao longo da sua vida docente destacado do Kodokan. Foi árbitro internacional, foi Presidente da Comissão de Graduações de Judo da União Europeia de Judo, Presidente da Comissão Nacional de Graduações. Publica em 1980 o Judo Ilustrado – Kyu & Dan e The Sport of Judo: As Practiced in Japan, em 1989. Foi sempre um consultor privilegiado da Federação Portuguesa de Judo. Tendo chegado com a graduação de 6º Dan a Portugal, atingiu o 9º Dan. Aguarda deferimento do Kodokan para ao pedido feito para ser graduado, postumamente, a 10º Dan.

Medicina oriental

Para além do judo, o Mestre fica indelevelmente ligado à medicina oriental, tendo ganho justa e merecida fama pelos resultados obtidos no tratamento quer de atletas de diversas modalidades como de individualidades da sociedade nacional. Funda o Instituto Kobayashi Nagasaki Dojo onde pratica medicina oriental e acupunctura. Entre inúmeros outros, conta-se a recuperação, dada como impossível, de Carlos Lopes a tempo de poder participar nos Jogos Olímpicos de 1984, em Los Angeles, onde ganha a Medalha de Ouro da Maratona. Os seus pacientes tornam-se, invariavelmente, seus admiradores e amigos como é o caso do ex-bastonário da Ordem dos Médicos, o Prof. Machado Macedo e do Rei Juan Carlos. Pelas suas mãos, passou também Mário Soares, antigo primeiro-ministro e Presidente da República.

Foi Presidente da Fundação MOA (Mochiki Okada Association) de Portugal, fundação cultural e de beneficência sem fins lucrativos. Para além disso, Kobayashi, demonstrou ser um excelente hóspede e hábil político. Como hóspede, ressalta o convite e apoio ao longo do tempo a delegações de judocas ao Japão e como político ressaltam os seus esforços junto do estado novo que permitiram a realização do Campeonato da Europa de Juniores em 1967.

Embaixador do Japão

Aliás, o Mestre tinha fama de ser o “verdadeiro” embaixador do Japão em Portugal a quem os próprios embaixadores recorriam para facilitar o conhecimento e integração no país. Por todo o lado onde passou, Kobayashi granjeou a admiração e estima de todos. Destacam-se entre os que ficaram seus amigos, o ex-Presidente dos EUA, Richard Nixon, na época vice-presidente dos EUA, o príncipe Constantino da Grécia, o Rei de Espanha Juan Carlos e o nosso ex-Presidente da República General Ramalho Eanes.

Com o avançar da idade e os problemas de saúde que começam a manifestar-se no Mestre, a sua filha Sachiko passa a visitá-lo regularmente, em Portugal, onde chegaram também a estar o seu marido e filho, por ocasião duma homenagem feita Mestre. Com o agravar de saúde do Mestre, Kobayashi regressa ao Japão em, onde permanecerá até ao seu falecimento aos oitenta e oito anos de idade, no dia 9 de Setembro de 2013, em Tóquio. Entretanto, Shachiko revela-se uma incondicional amiga do judo português e dos amigos do pai, continuando a visitar-nos regularmente e a honrar o nome e memória do Mestre.

Família

Como descendência, Kobayashi deixa a filha Sachiko, casada com Thomas Grollman, médico americano, e um neto, Maccowan Grollman, fruto desta união, residentes no Hawai. Nos últimos anos, Sachiko, permanece no Japão e continua a visitar-nos, mesmo após o falecimento do pai. A filha Michiko viria a falecer, sem deixar descendência. Em Portugal, deixa-nos o filho Renato Santos Kobayashi, e os netos Mariana Danif Vaz dos Santos Kobayashi, Guilherme Danif Vaz dos Santos Kobayashi e Catarina Danif Vaz dos Santos Kobayashi, todos eles jovens praticantes de judo.

Renato Kobayashi, que iniciou a pratica do judo em 1974, no Sport União Sintrense, tendo sido aluno do prof António Martins Borrego e do Mestre José Manuel Bastos Nunes, é um digno sucessor do pai. Enquanto atleta foi campeão nacional inúmeras vezes, de juvenis a veteranos, representou Portugal em diversos campeonatos da Europa e mundiais e participou nos Jogos Olímpicos de Seoul em 1988. Após a carreira competitiva, mantêm-se ligado à modalidade, em vários domínios. Foi Vice-Presidente da Associação Nacional de Treinadores durante 12 anos, Director da Federação Portuguesa de Judo, durante 3 anos, é Director e responsável técnico da escola de judo do Sport União Sintrense. É Presidente da escola de judo de formação A Turma dos Judokinhas. É treinador de judo de grau III, tendo sido treinador de diversos atletas de alto rendimento. É ainda Presidente do Centro Cultural Kiyoshi Kobayashi.  

Legado Kobayashi

Kobayashi deixa a Portugal um legado extraordinário, fruto de mais do que 50 anos de serviço à nossa sociedade sendo. Todo o conhecimento, experiência, resultados de excelência e notoriedade que temos atualmente no judo radicam no trabalho e na qualidade do Mestre. Ele foi, não só treinador de cntenas de atletas como formador de várias gerações de treinadores de excelência. A sua atuação enquanto impulsionador, treinador, árbitro, selecionador, formador e negociador foi decisiva para que o judo português tenha alcançado hoje um enorme prestígio a nível nacional e internacional.

Deixa-nos também a responsabilidade de perpetuarmos os seus ideais e valores. Diversas têm sido as homenagens feitas ao Mestre, após o seu desaparecimento, nomeadamente as organizadas regularmente pela Associação Distrital de Judo de Coimbra, sob a Presidência do Dr. Jorge Fernandes a que se têm associado diversas personalidades e instituições nacionais.

Centro Cultural Kiyoshi Kobayashi

Mas assume especial relevância a fundação do Centro Cultural Kiyoshi Kobayashi, dinamizado pelo seu filho Renato Santos Kobayashi, a que se associaram, desde o primeiro minuto, diversas personalidades e instituições da vida social portuguesa, como são o caso do ex-presidente da república, General Ramalho Eanes, e da Câmara Municipal de Sintra, através do seu Presidente, Dr. Basílio Horta. Fundado, por escritura notarial, a 20 de Maio de 2015, tem sede no Pavilhão do Japão, no Parque da Liberdade, em plena Vila de Sintra, o Centro constituiu-se com o objetivo de promover “ações de caráter cultural, educativo, desportivo, artístico, recreativo, cientifico e social que visem a valorização do património cultural japonês em Portugal e como fórum de reflexão e debate para o desenvolvimento das ações culturais e das práticas desportivas japonesas, visando homenagear a memória do Mestre de Judo Kiyoshi Kobayashi.”

A reedição do livro do Mestre O judo ilustrado – Kyu e Dan é mais uma das já diversas e felizes iniciativas levadas a cabo pelo Centro Cultural.

Continua Artigo no Judo Magazine Reconhecimento em Portugal e no Japão [2]

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