Teresa, não se desiste!

O Mestre olhou para mim, com olhos que falavam
Por Teresa Gaspar, atleta olímpica e professora de Educação Física.
Enquanto competidora de Judo, tive o privilégio de conviver com o mestre Kiyoshi Kobayashi (KK) em treinos do JCP, em competições nacionais a que o mestre assistia e em competições internacionais por ele acompanhadas.
Recordo uma pessoa reservada mas simpática e muito generosa, com um conhecimento profundo do Judo e do corpo. Tinha um sentido de humor muito próprio e uma forma de comunicação muito eficaz.
Recordo particularmente duas situações que me marcaram.
A magia dos pontos de controlo de KK
Conheci o mestre num treino no JCP (não tinha mais de 15 anos). Recordo um exercício de imobilizações e saídas. O mestre imobilizou-me. Não me sentia muito controlada, nem sentia quase nenhuma pressão. Pensei que estava a ser subestimada, no entanto, quando tentei sair, percebi de imediato a eficácia do controlo de cada ponto e a falta de espaço para me movimentar. A forma como ele geria os pontos de controlo e a pressão exercida era muito eficiente, era O JUDO, a “magia”, aquilo que já me deslumbrava nesta modalidade e me fazia querer aprender mais.
Ao longo da minha carreira competitiva, beneficiei muito do saber e generosidade do Mestre. Em competições diferentes, sofri três luxações parciais. As do cotovelo e do esterno, foram reduzidas pelo Mestre, de imediato, no local da competição. A do ombro, sofrida durante os Jogos Olímpicos, foi posteriormente tratada pelo Mestre, no seu consultório. Jamais esquecerei estas preciosas ajudas.
Ainda fiz mais um combate
A primeira destas lesões, ocorreu no Campeonato da Europa de 88. No combate com a judoca que venceu a competição, empatado até perto do final, para evitar uma projeção, coloquei a mão direita no solo, o que originou uma luxação parcial do cotovelo. Em seguida fui imobilizada. O tempo do combate terminou, continuando a contar o tempo de imobilização (na altura 30’’). Bati, desistindo. Saí do tapete com fortes dores no cotovelo e sem conseguir fazer a extensão do braço. Hugo Assumpção, percebendo a situação pediu ao mestre para me observar. O Mestre pediu ao Hugo para me segurar e com uma manipulação forte, segura e rápida, reduziu o problema. Fiquei de imediato com mobilidade e quase sem dor. Ainda fiz mais um combate.
Completarmos a tarefa a que nos propusemos
Depois desta manipulação, o Mestre olhou para mim, com olhos que falavam, e perguntou “Teresa, porque desistiu?”. Parecia-me óbvio, ainda assim respondi “Mestre, o tempo tinha terminado, não tinha qualquer hipótese de recuperar e estava com muitas dores…”. Continuou a olhar para mim e concluiu, “Teresa, não se desiste!”. Foram poucas as palavras, mas muito o conteúdo. Nunca tinha analisado esta questão com ninguém, no entanto, naquele momento, entendi que o mais importante é o nosso percurso, é completarmos a tarefa a que nos propusemos, é irmos até ao fim. Pode parece algo simples e insignificante, mas não é. Na vida, não desistir faz toda a diferença.
Encontrei o Mestre, pela última vez, no 50°aniversário da FPJ, onde foi justamente homenageado. Cumprimentei-o. Retribuiu com o seu doce sorriso, o bastante para saber que se lembrava de mim, e agradeci:
Muito obrigada por tudo, Mestre!
Editado JM – Títulos e subtítulos | Editámos a 3/04 11:30 a apresentação da autora de treinadora de judo para professora de educação física.