25/04/2025
teresa

O Mestre olhou para mim, com olhos que falavam

Por Teresa Gaspar, atleta olímpica e professora de Educação Física.

Enquanto competidora de Judo,  tive o privilégio de conviver com o mestre Kiyoshi Kobayashi (KK) em treinos do JCP, em competições nacionais a que o mestre assistia e em  competições internacionais por ele acompanhadas.

Recordo uma pessoa reservada mas simpática e muito generosa, com um conhecimento profundo do Judo e do corpo. Tinha um sentido de humor muito próprio e uma forma de comunicação muito eficaz.

Recordo particularmente duas situações que me marcaram.

A magia dos pontos de controlo de KK

Conheci o mestre num treino no JCP (não tinha mais de 15 anos). Recordo um exercício de imobilizações e saídas. O mestre imobilizou-me. Não  me sentia muito controlada, nem sentia quase nenhuma pressão.  Pensei que estava a ser subestimada, no entanto, quando tentei sair, percebi de imediato a eficácia do controlo de cada ponto e a falta de espaço para me movimentar. A forma como ele geria os pontos de controlo e a pressão exercida era muito eficiente, era O JUDO, a “magia”, aquilo que já me deslumbrava nesta modalidade e me fazia querer aprender mais.

Ao longo da minha carreira  competitiva, beneficiei muito do saber e generosidade do Mestre. Em competições diferentes, sofri três luxações parciais. As do cotovelo e do esterno, foram reduzidas pelo Mestre, de imediato,  no local da competição. A do ombro, sofrida durante os Jogos Olímpicos,  foi posteriormente tratada pelo Mestre, no seu consultório. Jamais esquecerei estas preciosas ajudas.

Ainda fiz mais um combate

A primeira destas lesões, ocorreu no Campeonato da Europa de 88. No combate com a judoca que venceu a competição, empatado até perto do final, para evitar uma projeção, coloquei  a mão direita no solo, o que originou uma luxação parcial do cotovelo. Em seguida  fui imobilizada. O tempo do combate terminou, continuando a contar o tempo de imobilização (na altura 30’’). Bati, desistindo. Saí do tapete com fortes dores no cotovelo e sem conseguir fazer a extensão do braço.  Hugo Assumpção, percebendo a situação pediu ao mestre para me observar. O Mestre pediu ao Hugo para me segurar e com uma manipulação forte, segura e rápida, reduziu o problema. Fiquei de imediato com mobilidade e quase sem dor. Ainda fiz mais um combate.

Completarmos a tarefa a que nos propusemos

Depois desta manipulação, o Mestre olhou para mim, com olhos que falavam,  e perguntou “Teresa, porque desistiu?”. Parecia-me óbvio, ainda assim respondi “Mestre, o tempo tinha terminado, não tinha qualquer hipótese de recuperar e estava com muitas dores…”. Continuou a olhar para mim e concluiu, “Teresa, não se desiste!”. Foram poucas as palavras, mas muito o conteúdo. Nunca tinha analisado esta questão com ninguém,  no entanto, naquele momento, entendi que o mais importante é o nosso percurso,  é completarmos a tarefa a que nos propusemos, é irmos até ao fim. Pode parece algo simples e insignificante, mas não é. Na vida, não desistir faz toda a diferença.

Encontrei o Mestre, pela última vez, no 50°aniversário da FPJ, onde foi justamente homenageado. Cumprimentei-o. Retribuiu com o seu doce sorriso, o bastante para saber que se lembrava de mim, e agradeci:

 Muito obrigada por tudo, Mestre!

Editado JM – Títulos e subtítulos | Editámos a 3/04 11:30 a apresentação da autora de treinadora de judo para professora de educação física.

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