09/12/2024

IG VESTE JUDOGI |Mulheres no olimpismo vinte e oito anos depois dos pares

JUDO MAGAZINE | 28 de novembro 2020 | A AIG veste o Judogi | Igualdade de género no judo

Almudena López molda ao seu jeito a história do judo feminino, valoriza as fundadoras, destaca a audácia e a persistência das construtoras de Munique nos anos 70 e de Nova York já em 80 e não hesita em enaltecer o sentido de empoderamento que as europeias atribuíram a uma modalidade que no Japão, na vertente feminina, permanecia na meditação e na medicação.

Almudena deitou a lupa de investigadora a 40 anos de judo na imprensa espanhola, investigou e aprofundou a sua abordagem peculiar ao judo feminino. Quereremos certamente continuar a conversar com ela.

MUDANÇAS DE SENTIDO DO JUDO FEMININO

por Almudena López*

Olhando para o panorama desportivo, não parece haver grandes diferenças de género entre os praticantes de judo. É normal aceder a notícias e a imagens de mulheres em situação de competição. Será também o primeiro desporto a ter uma participação nos Jogos Olímpicos de Tóquio, com equipes mistas com um objetivo comum. No entanto, nem sempre foi assim, e das águas passadas sobraram algum lodo.

Revendo documentos históricos, descobrimos que a primeira pessoa que Jigoro Kano ensinou foi sua irmã mais velha, Katsuko, a quem ele mostrou movimentos aprendidos nas suas aulas de Ju Jutsu. Tudo indica que a sua primeira intenção terá sido mostrar os benefícios que a prática proporcionava sem ter em conta o género, desde que realizada com uma programação adaptada às necessidades de cada praticante.

Mulheres entram no Kodokan

Foi este propósito de progresso individual que este presente no começo do judo, porém, a percepção social que pairava sobre a atividade física feminina vetou, numa fase inicial, a prática por motivos relacionados com a fragilidade física, a intolerância à dor e a proteção à fertilidade. Esses motivos atrasaram a entrada das mulheres no Instituto Kodokan, até 1926. Quando tal aconteceu foi considerado um acontecimento revolucionário.

A primeira secção feminina foi constituída por nove familiares de membros do Instituto, que concordaram em cumprir algumas formalidades, tais como fazer-se acompanhar por uma instrutora que se comprometia a supervisionar as orientações dos treinadores. Entre essas pioneiras estiveram Keiko Fukuda e Masako Moritori, alunas muito valorizados pelo Mestre Kano, que foram as primeiras a atingir o nível mais alto permitido para mulheres, o 5º Dan, em 1940. Eles realizaram a demonstração do Ju No Kata nos Jogos Olímpicos de Tóquio em 64, ampliando a imagem do que era o judo feminino na época.

Saúde e relações sociais

No início, as mulheres não estavam autorizadas a competir, por acreditarem que a sua função reprodutora devia ser salvaguardada e protegida. Da mesma forma, o confronto não era admitido porque não fazia parte do caráter adequado que se esperava delas, devido à construção cultural que reinava na sociedade. As primeiras japonesas que se iniciaram no judo fizeram-no como uma atividade que melhorava a sua saúde e as suas relações sociais. Segundo a pesquisadora Kaori Yamaguchi, os seus estudos mostram que a principal base do treino do judo feminino no Japão, tinha como objetivos “meditar e medicar”.


O que no Japão tinha finalidades ligadas á saúde, na Europa foi identificado com um empoderamento feminino, nesses termos a prática de artes marciais esteve associada às primeiras vagas feministas europeias. As primeiras abordagens estão relacionadas com a autodefesa para fortalecer as mulheres de classes socioeconómicas mais abastadas, que dispunham de tempo e recursos. Da mesma forma, do outro lado do Atlântico, nos Estados Unidos, o judo feminino começou como uma fórmula mista que englobava vida saudável e autodefesa, e dessa forma conseguiram regular a prática feminina naquele país. Hoje Keiko Fukuda é referência por ter ampliado o significado original do judo através dos katas e Rena “Rusty” Kanokogi que impulsionou a prática desportiva feminina através da competição, atingindo a igualdade neste campo do desenvolvimento do judo.

Nova York 1980

Na Europa, no início da década de 70, começam a surgir provas amigáveis mas foi somente em 1975 que aconteceu o Primeiro Campeonato Europeu feminino, em dezembro, em Munique, com três categorias de peso. E cinco anos depois o Campeonato do Mundo será em Nova York, nos dias 20 e 30 de novembro, desta vez contemplando as sete categorias de peso.

A decolagem competitiva impõe uma mudança estrutural no treinamento e com ela ocorre um desenvolvimento evolutivo diferente com novas possibilidades na prática. Os treinos mudam, passam a ser conjuntos, partilham metodologia e, a partir de 1988, os torneios oficiais são realizados no mesmo local respeitando as categorias de género e peso.

Sucessos não têm sexo

A participação olímpica abre ao judo um novo rumo para um novo reconhecimento como desporto, tal como o conhecemos hoje. As mulheres entram no olimpismo vinte e oito anos depois dos seus pares e, com isso, emerge uma mudança de identidade, que passa do objetivo principal da autodefesa para a construção desportiva para a superação competitiva. A designação como desporto avança para novos objetivos, deixa de ser considerada uma arte marcial e passa a ter um sentido profissional. Além disso, isso aumenta a participação feminina, as políticas de género e os auxílios estatais que provam que os sucessos não têm sexo e têm o mesmo valor. Não importava quem conquistasse as medalhas, fossem homens ou mulheres, o principal era aumentar os resultados e, com isso, o prestígio dos países. Essa ideia estendeu-se a clubes e federações, onde a presença feminina se apresenta como mais uma forma de aumentar o número de praticantes inscritos e o o seu próprio reconhecimento.

O judo feminino não não era tido no plano social como um desporto até á sua presença nos Jogos Olímpicos. Desde essa ocasião abandona os seus atributos relacionados com a defesa pessoal e assume novos objetivos no plano desportivo. Neste momento é particularmente importante definir a atividade por especialidades para que não fiquem as possibilidades de práticas e de benefícios que cada um queira atingir sem a obrigação de cumprir com as correntes sociais.

TEXTO: Almudena López PhD.

Blog: www.judobywoman.com

López Chaves. A. (2019). “El tratamiento del judo femenino en la prensa española 1972-2012”. Universidad Complutense de Madrid. UCM.

Fotos © Gonçalo Pérez | Editado título/subtítulos CR- JMagazine

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