Realizámos o nosso Estágio Nacional de Arbitragem em plena pandemia

ARBITRAGEM | Nuno Martins de Carvalho – ENTREVISTA

Como tantas vezes se afirma, sem eles nada acontece. E é verdade, tanto no judo como noutras modalidades desportivas, os árbitros são as formiguinhas que realizam as suas tarefas de forma discreta, laboriosa e empenhada e no final, quando se retiram de cena, ficam os outros protagonistas com o destaque natural para quem venceu ou lutou por vencer, situação intrínseca à competição e ao desporto.

Nuno Martins de Carvalho representa na atualidade do judo nacional a figura de proa de um sistema que funciona. Felizmente para a modalidade existem árbitros olímpicos e paralímpicos (Carlos Duarte e Eduardo Garcia) e árbitros continentais para além dos nacionais e distritais. Foi junto do responsável da arbitragem nacional e membro da Comissão de Arbitragem da UEJ – União Europeia de Judo que conversámos sobre o estado da arte da arbitragem no judo em Portugal.

JUDO MAGAZINE – O judo nacional tem apresentado bons resultados em diversos planos, veja-se a valorização da UEJ à co-organização dos Europeus de Lisboa, podemos afirmar que a arbitragem nacional tem acompanhado esta evolução positiva?


NUNO MARTINS DE CARVALHO
– A Arbitragem nacional tem tido uma evolução bastante acentuada, principalmente nestes últimos anos, sendo mais um dos campos de aposta do actual Presidente da FPJ e sua Direcção. Apesar de este Conselho de Arbitragem já estar em funções desde 2013, apenas a partir de 2017 conseguimos colocar em prática a nossa estratégia e o nosso plano para a Arbitragem – nacional e internacional – por antes não nos terem sido dadas as necessárias condições. Nesse primeiro período vimos surgir um fosso enorme entre o panorama que existia – Arbitragem Portuguesa representada nos mais altos eventos Mundiais, como Campeonatos do Mundo e da Europa, Grand Slam, Grand Prix – e o panorama que passou a existir – falta de aposta e de apoios para a Arbitragem Internacional e mesmo nacional.

Felizmente, nestes últimos anos temos conseguido reverter essa situação e temos uma lista grande de Árbitros à disposição do Conselho de Arbitragem para as competições nacionais, com o surgimento de muitas caras novas e com bastante qualidade.

Também a nível internacional se tem sentido uma grande diferença, com a participação massiva dos nossos Árbitros nos eventos internacionais, e com um leque já considerável de Árbitros Portugueses com categoria Internacional, regularmente convocados para os grande eventos Europeus, nomeadamente para os Campeonatos da Europa dos vários escalões, o que só é possível com a aposta conjunta do Conselho de Arbitragem e do Presidente da FPJ e sua Direcção.

JM – Em termos comparativos, atendendo a referências objetivas (número de árbitros continentais, de elite, nacionais etc) como é que podemos situar a arbitragem portuguesa em relação aos outros países europeus?


NMC – Fazer uma comparação directa com os outros países em termos de números é sempre um engano, uma vez que temos um universo de praticantes / inscritos bastante inferior à maior parte dos países europeus. No entanto, isso não nos impede de ter tanta, ou mais qualidade, nas várias áreas em que estamos envolvidos. Assim, diria que, tendo em conta a diferença de números que existe entre Portugal e a grande parte dos países europeus, nomeadamente no que respeita à Arbitragem, apesar de em inferioridade numérica, Portugal tem valores que ombreiam com os melhores da Europa e será uma questão de tempo até voltarmos a ter a Arbitragem Portuguesa nos grandes eventos Mundiais.

JM- Quando esta fase difícil de pandemia tiver atenuado os seus efeitos na organização aberta de eventos, serão realizadas ações de compensação e de aceleração dos processos de formação de novos árbitros e árbitras e de atualização das competências dos atuais?


Apesar de termos tido esta fase difícil, que poucos ou nenhuns imaginaram que pudesse alguma vez acontecer, com o Mundo inteiro em “lock down”, a Federação Portuguesa de Judo foi das poucas instituições – e eu diria mesmo a nível Mundial – que se manteve a trabalhar para além do normal, e isso aconteceu não apenas com a parte desportiva em sentido estrito, com os judocas da selecção nacional em estágios constantes, sempre em sistema de bolha, mas igualmente com a parte da Arbitragem, tendo nós realizado o nosso Estágio Nacional de Arbitragem em Setembro de 2020 (em plena Pandemia), em total segurança, cumprindo todos os requisitos impostos pelo Governo e pela DGS, tendo tido participantes em regime presencial, mas também por video conferência – participantes da Madeira e dos Açores -, o que aconteceu pela primeira vez, e deu oportunidade a que todos pudessem participar nesta Acção. É verdade que não realizámos qualquer Acção em 2021, e normalmente realizamos um Estágio de Arbitragem em Janeiro, mas tendo em conta que a prioridade é transmitir as indicações e directivas que recebemos regularmente  da IJF e da EJU, e estas entidades cancelaram as suas acções em 2020 (EJU) e 2021 (IJF e EJU), acabámos por realizar mais acções do que seria previsto, de âmbito nacional, e da competência do Conselho de Arbitragem da FPJ. Além disso, o calendário também ficou muito reduzido com a realização de poucas ou nenhumas competições nacionais em determinados períodos do ano, devido à proibição imposta pelas autoridades.

Relativamente às Acções de formação de novos Árbitros, a competência é exclusiva das Associações Distritais, que têm feito um bom trabalho ao longo destes últimos anos, e com quem o Conselho de Arbitragem tem estado em contacto directo e permanente, de forma a que a informação circule em ambos os sentidos.Estou certo que, ultrapassado este período de restrições, iremos assistir à realização massiva de Acções de Formação em regime presencial, e a área que diz respeito à Arbitragem não será excepção.

JM – Numa perspetiva de género, como é que a Comissão de Arbitragem avalia os esforços realizados para que uma maior igualdade de género se exprima na arbitragem nacional?


NMC – A igualdade de género nas várias áreas acontecerá de maneira mais ou menos natural à medida que caminharmos para uma igualdade de número de praticantes / inscritos entre homens e mulheres.Enquanto tivermos uma percentagem substancialmente maior de homens do que mulheres envolvidos na prática do Judo, é mais do que natural que os homens surjam em maior percentagem nas diversas vertentes da modalidade.Estar a adoptar uma política em que se force uma igualdade de género, quando ela não existe de base é, na minha perspectiva, deixar de olhar para a competência e para a qualidade, para nos focarmos apenas na quantidade.

É desejável que essa igualdade seja atingida, mas de forma mais ou menos natural e não forçada. No entanto, é com grande satisfação que assistimos a uma evolução, não só quantitativa, mas também qualitativa, da Arbitragem no que respeita tanto a homens como a mulheres.

JM -Como é que avalia a nomeação já realizada dos árbitros para Os Jogos de Tóquio 2020?

NMC – Quando vemos a lista de Árbitros seleccionados para os Jogos Olímpicos, devemos reconhecer os nomes daqueles que são os melhores a nível Mundial. Ora, existindo quotas continentais – apesar de não se indicar expressamente – nem sempre todos os melhores estão presentes. A Europa é sempre o Continente mais prejudicado, pois é mais do que reconhecido que é no nosso continente que existem os melhores Árbitros, e isso tem sido demonstrado ao longo dos vários ciclos Olímpicos. Assim sendo, e havendo elevadíssima qualidade por parte de um grande número de Árbitros, principalmente europeus, são por vezes pequenos pormenores que definem a nomeação ou não deste ou daquele Árbitro para os grandes eventos e, principalmente, para os Jogos Olímpicos, onde o número total de Árbitros nomeados tem vindo a diminuir nos últimos ciclos.Dito isto, e tendo pleno conhecimento do sistema em que assenta a nomeação para os JO, não deixa de ser surpreendente um ou outro nome constante da lista final, em detrimento de outros, mas a decisão está tomada e são os Árbitros que constam dessa lista que estarão em Tóquio a arbitrar os combates mais importantes deste ciclo olímpico e, esperamos, sem problemas.

Fotos : © ijf e fpj

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